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06 abril 2012

Sexta Feira Santa


Comentário:
              Sentimos em cada parágrafo todo contexto do que representava a Sexta Feira Santa, para Gibran Khalil Gibran, Célebre escritor libanês, nascido em Bicharre, 6 de janeiro de 1883 –Falecido em Nova Iorque, 10 de abril de 1931.
                     Foi um grande ensaísta e Pensador com vários livros publicados. O texto é longo, mas vale a leitura e reflexão do mesmo, por ser um texto atemporal, as nuances no contexto religioso, filosófico e por que não dizer político, encaixa-se e nos levam à introspecção e conjeturas sobre o mesmo.( maria claudete)
                            

Hoje, e em cada sexta-feira Santa, a humanidade acorda de seu sono profundo
e, em pé ante as sombras do século, olha através das lágrimas o Monte
Gólgota para ver Jesus crucificado em sua cruz... Mas assim que o sol se
põe, a humanidade volta a ajoelhar-se perante os ídolos que se erguem sobre
todos os montes.

Hoje, guiados pela recordação, as almas dos cristãos dirigem-se de todos os
cantos do mundo às cercanias de Jerusalém para contemplar uma sombra coroada
de espinhos, que estende os braços até o infinito e penetra, através do véu
da morte, as profundidades da vida. Mas, mal as cortinas da noite tenham
descido sobre o palco do dia, os cristãos voltam a deitar-se à sombra do
esquecimento, embalados pela ignorância e a indolência.

Hoje, e em cada Sexta-Feira Santa, os filósofos abandonam suas grutas
escuras, os pensadores, seus eremitérios frios, e os poetas, seus vales de
quimeras,para se reunirem numa alta montanha e escutarem, calados e
reverentes, um jovem dizer de seus assassinos: "Pai, perdoa-lhes porque não
sabem o que fazem". Mas, mal a quietude tenha apagado os ruídos do dia, os filósofos, pensadores e poetas voltam a envolver suas almas nas mortalhas de livros gastos.

As mulheres distraídas pelo brilho da vida, apaixonadas por jóias e
vestidos, saem hoje de suas casas para ver a mulher dolorida, de pé frente à
cruz como uma árvore flexível frente às tempestades do inverno.  

Os jovens e as jovens que se deixam levar pela corrente da vida sem saber
aonde vão, param hoje um instante para contemplar a Madalena Lavando com
suas lágrimas o sangue que mancha os pés do homem erguido entre a Terra e o
Céu. Mas, quando se cansam desse espetáculo, desviam os olhos e continuam
seu caminho entre risadas.

Num dia como este todos os anos, a humanidade acorda com o despertar da
primavera e chora pelos sofrimentos de Cristo; mas, depois, fecha os olhos e
se entrega a um sono profundo.

A humanidade é uma mulher que se deleita em se lamentar pelos heróis do
séculos. Se fosse homem, regozijar-se- ia pela sua grandeza e suas glórias.
A humanidade vê Jesus o Nazareno nascendo e vivendo como um pobre, ofendido
como um fraco, crucificado como um criminoso, e chora-o e lamenta-o. E é
tu
do o que ela faz.
Desde há dezenove séculos, adoram a fraqueza na pessoa de Jesus, conquanto
Jesus fosse um forte. Mas eles não compreendem o sentido da verdadeira
força. Não viveu como um covarde, nem morreu sofrendo e queixando-se. Viveu
como um revolucionário, e foi crucificado como um rebelde, e morreu como um
herói.Não era Jesus um pássaro de asas partidas, mas uma tempestade violenta que
quebra, com sua força, todas as asas tortas.
Jesus não veio do além do horizonte azul para fazer da dor o símbolo da
vida, mas para fazer da vida o símbolo da verdade e da liberdade.

Jesus não receou seus perseguidores, e não temeu seus inimigos, e não sofreu

nas mãos de seus executores, mas era livre à face de todos audaciosos para
com a injustiça e a tirania: quando via tumores pútridos, puncionava-os;
quando ouvia o mal falar, impunha-lhe silêncio; quando encontrava a
hipocrisia, esmagava-a.
Jesus não desceu ao mundo da luz para destruir as nossas casas e, com suas
pedras construir conventos e eremitérios. Não veio para tirar os homens
fortes de suas ocupações e fazer deles monges e padres.
Mas veio para insuflar na atmosfera deste mundo uma alma nova e forte que
destrói, até as fundações, os tronos elevados sobre os crânios e desmantela
os palácios erguidos sobre os túmulos, e derruba os ídolos impostos aos
espíritos fracos e humildes.

Jesus não veio ensinar os homens a elevar igrejas suntuosas ao lado de

casebres miseráveis e de habitações frias e escuras, mas veio para fazer do
coração do homem um templo, e de sua alma um altar, e de sua mente um
sacerdote.

Eis o que Jesus o Nazareno fez, e eis os princípios que pregou e pelos quais

se deixou crucificar por sua própria vontade. E se os homens fossem mais
penetrantes, celebrariam a data de hoje com alegria, e risos e canções de
vitória e de triunfo.

E tu, gigante crucificado, que olhas do alto do Gólgota as caravanas dos

séculos; que ouves o barulho dos povos, que compreendes os sonhos da
eternidade, tu és, sobre tua cruz manchada de sangue, mais majestoso e mais
soberbo que mil reis com mil tronos e mil reinos. E tu és, entre a agonia e
a morte, mais poderoso e mais temível que mil generais com mil exércitos e
mil troféus.
Tu és, na tua melancolia, mais alegre que a primavera com suas flores. Tu
és, nas tuas dores, mais sereno que os anjos em seu paraíso. Tu és na mão
dos carrascos, mais livre que a luz do sol. A coroa de espinhos em tua
cabeça mais formosa e mais augusta que a coroa de Buhram, e o prego na palma
de tua mão é mais imponente que o cetro de Muchtary.
E as gotas de sangue que correm em teus pés são mais brilhantes que as joias
de Astarté.

Perdoa, pois, a esses fracos que se lamentam sobre ti, em vez de

se lamentarem sobre si mesmos.
Perdoa-lhes porque não sabem que venceste a morte pela morte, e deste vida
aos que estão nos túmulos.



Khalil Gibran
do livro Parábolas

Obs: este texto foi-me enviado por Helena Ramalho e transcrito
          De: Lourdes Cavalcanti



Escrito por maria claudete f.h.batista
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